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Parte I - Teoria geral |
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A teoria não é a prática da guerra. Nada pode ser absoluto na guerra. (...) A experiência da guerra é uma experiência específica. A guerra é a mãe de todas as coisas. A guerra não é uma questão sobrenatural, mas antes um acontecimento submetido a leis definidas. Os progressos da técnica moderna aumentaram as possibilidades de estabelecer planos para a guerra. Todavia, uma elaboração de planos completos e estáveis é difícil porque a certeza na guerra é de facto muito limitada e momentânea. A guerra é um todo indivisível, cujas partes (os resultados subordinados) não têm qualquer valor, excepto na sua relação com o todo. Na guerra nada se obtém senão pelo cálculo. Na guerra querem-se ideias simples e precisas. Toda a guerra deve ser metódica, porquanto toda a guerra deve ser conduzida consoante os princípios e as regras da arte e com uma finalidade; ela deve ser feita com forças proporcionais aos obstáculos que se prevêem. A decisão pelas armas, em todas as operações, grandes ou pequenas, de uma guerra, é como o pagamento em dinheiro em transacções comerciais. As nossas guerras serão de facto travadas antes mesmo de se travarem as operações militares. A táctica é a teoria da utilização das forças militares em combate. Estratégia é a teoria da utilização dos combates para alcançar o objectivo da guerra. Todo o guerreiro se baseia na simulação. Portanto, na guerra é de suprema importância atacar a estratégia do inimigo. Os elementos da arte da guerra são, primeiro, a noção de espaço, segundo, a apreciação das quantidades; terceiro, os cálculos; quarto, as comparações, e, quinto as possibilidades de vitória. A água não tem forma constante. Na guerra também não existem condições constantes. Há cinco pontos conducentes a operações militares: primeiro, a busca da fama; segundo, a luta por vantagens; terceiro, a acumulação de animosidades; quarto, a desordem interna; quinto, a fome. Para abater um inimigo, é necessário quebrar o seu equilíbrio, introduzindo no campo das operações um factor psicológico ou económico que o coloque em posição de inferioridade, antes de poder ser lançado contra ele um ataque com hipóteses de sucesso definitivo. Não poderia haver terror sem uma encenação da tragédia, sem romantismo da morte. Não se combate sem fé. E a guerra aprende-se. Não realizamos nenhuma acção que não seja com a certeza e a decisão de alcançar o êxito previsto. A guerra é um jogo, tanto objectiva, como subjectivamente. (...) O absoluto, o matemático, como é chamado, em nenhum lugar encontra uma base segura nos cálculos da arte da guerra. A política, pois, está entrelaçada em toda a acção da guerra, e deve sobre ela exercer uma influência contínua, na medida em que a natureza das forças por ela libertada o permita. A guerra é uma mera continuação, por outros meios, da política. (...) A guerra são os meios. A eficácia superior não pertence aos meios, mas ao fim, e estamos apenas a comparar o efeito de um propósito realizado com o outro. Por isso dizemos que a guerra não pertence nem ao campo das artes nem ao das ciências, mas ao campo da vida social. É um conflito de grandes interesses que é resolvido com derramamento de sangue e só nisso é diferente dos outros. Em vez de a comparar com qualquer arte, seria melhor assemelhá-la a uma competição de negócios, o que também é um conflito de interesse e actividades humanas; e é ainda mais parecido com a política do Estado que também, por seu lado, pode ser considerada como uma espécie de competição de negócios em grande escala. Além disso, a política do Estado é o ventre onde a guerra se desenvolve, onde o seu contorno jaz encoberto num estado rudimentar, tal como as qualidades das criaturas vivas nos seus germes. Qualquer meio que uma vez prove ser eficaz na guerra, logo é repetido (...). (...) Todo o método de conduzir a guerra está dependente dos instrumentos utilizados; (...). Estratégia é a utilização da batalha para ganhar o fim da guerra (...). A estratégia forma o plano da guerra; (...). Os possíveis combates, por causa dos seus resultados devem ser considerados como reais. (...)A mera possibilidade de uma batalha produzir resultados deve, pois, ser classificada entre os acontecimentos efectivos. (...) As forças morais estão entre os mais importantes sujeitos na guerra. (...) Desistir do homem e passar para o papel que lhe designaram para desempenhar na guerra, isso é a capacidade militar no indivíduo. Uma nação só pode esperar ter uma posição forte no mundo político se o seu carácter e prática em guerra efectiva mutuamente se ocuparem em constante acção recíproca. Qualquer guerra pressupõe a fraqueza humana e é contra ela que é dirigida. (...) A guerra e a paz são ideias que, no seu fundamento, não podem ter gradações; (...). (...) As actuais alterações da arte da guerra são a consequência de alterações na política. A luta de dois conceitos imateriais não pode cessar senão quando os defensores de um dos dois não tiverem mais capacidade de resistência. (...) Se uma coisa é boa para um adversário, será inevitavelmente má para outro. Existirá sempre uma acção concreta - material ou verbal - que provoca a sequência de paradas e respostas (Desafio). Tipicamente a causa imediata de uma crise é a tentativa de um actor coagir outro pela ameaça, explícita ou implícita da força (...). Normalmente, as forças militares são apenas o pano de fundo com que se ameaça à situação de guerra, e as movimentações militares efectuadas procuram aumentar a credibilidade da ameaça e a iminência da sua concretização (...). (...) Em teoria, desde que seja necessário para atingir o fim, é legítimo o uso ilimitado da força (...). (...) A guerra é a luta de classes levada a efeito com meios físicos violentos e organizados. Todas as guerras são inseparáveis dos sistemas políticos que engendram (...) A guerra é a forma suprema de luta entre nações e Estados, entre classes ou grupos políticos (...). Também a guerra em acto é "paixão", a mais intensa e febril, é um momento da vida política, é a continuação, sob outras formas, de uma determinada política. Assim a guerra envolve o todo social, quando eclode é um estado específico de toda a sociedade e não apenas daqueles que praticam a luta armada. A paz não é mais do que a continuação da guerra por outros meios. A guerra pode ser feita: obedecendo a certos constrangimentos ou regras; sem obediência a constrangimentos ou regras. A guerra é um processo inventado pelo homem que lhe permite resolver conflitos para os quais ainda não encontrou outro processo de solução. Numa guerra actuam homens, grupos, nações; obedecendo ou não a certas limitações. A guerra irracional é aquela a que uma política racional, mas teórica, normalmente conduz. (...) As guerras da era contemporânea são guerras integrais no sentido de modificação. Nenhum Estado pode estar certo de que é a racionalidade para o outro. Despreza, pois, as teorias pacifistas e internacionalistas. O pa-triotismo e o amor à guerra nada têm a ver com a ideologia: são princípios de higiene, sem os quais só há decadência e morte. Consideramos ultrapassada e ultrapassável a hipótese de fusão amigável dos povos, e só admitimos para o mundo uma única higiene: a guerra. Queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo -, o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos anarquistas, as belas Ideias que matam, e o desprezo pela mulher. A guerra não é apenas um confronto de populações ou de homens, é um assalto de tecnologias. É necessário visar para matar. Aquilo que mata é o olhar, a designação. A guerra é uma questão de opinião. Depois de uma batalha perdida, a diferença entre o vencido e o vencedor é pequena. Não é um incidente quem deve governar a política, mas sim a política que deve governar os incidentes. A arte da guerra consiste em ganhar tempo quando se tem forças inferiores. A reputação das armas na guerra é tudo e equivale às forças reais. Um dos primeiros princípios da guerra é exagerar as suas forças e não diminuí-las. Negai-vos a parlamentar, são meios de que os nossos inimigos sempre se serviram contra nós. Quando se conhecem os fins a atingir, com um pouco de reflexão, os meios vêm facilmente. Como leis de condução da guerra a estratégia e a táctica constituem a arte de nadar no oceano da guerra. Numa palavra, a guerra não deve, nem por por um só momento, ser separada da política. Pode portanto dizer-se que a política é guerra sem derramamento de sangue, e a guerra, política sangrenta. A guerra é uma competição de forças que, no próprio decorrer da guerra, se vão modificando com relação ao que eram no início. Antes do estalar a guerra, toda a organização e toda a luta têm o fim de preparar a guerra (...). (...) A guerra só pode abolir-se com a guerra. O que é a estratégia? A palavra (...) designa originalmente a arte de fazer evoluir um exército sobre um teatro de operações até ao momento em que ele entra em contacto com o inimigo. (...) A eficácia militar está dependente da determinação política. A táctica situando-se no contacto visual do inimigo, a estratégia sendo de dimensões mais vastas e situando-se para além dos olhares e dos golpes. A táctica e a estratégia correspondem a duas atitudes de espírito distintas, a duas essências de pensamento e de acção guerreiras. A estratégia e a táctica formam um todo indissociável da arte da guerra. O pensamento estratégico de uma dada época é a expressão do estado das técnicas. A nossa estratégia é um contra dez enquanto que a nossa táctica é dez contra um. A estratégia permanece implicada pela evolução científica e técnica, a tecnologia é um teatro de operações, um verdadeiro campo de batalha. Doravante, já não existe estratégia; apenas crises a gerir. (...) Um estado de vigilância permanente e global, para adquirir sempre mais informações, e não atacar senão pela certa, com o melhor rendimento político possível. |